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15 março 2021

MEMORIAL DO CONVENTO - Blimunda - a personagem que «vê às escuras» (entrevista)

Entrevistadora: Bruna Cuco

Entrevistada: Blimunda de Jesus 

Como aluna do 12ºano estou a estudar o Memorial do Convento e Blimunda de Jesus que me chamou bastante à atenção, é uma das personagens principais do romance, estava junta com Baltasar, abençoados por Bartolomeu Lourenço, em cerimónia ritual de casamento informal, e tem um historial de vida bastante complexo por enfrentar muitas dificuldades, decidi entrevistá-la para rever toda a sua vida e passagens na obra.

Bruna: Blimunda sabemos que esteve junta com Baltasar até ao fim. Qual foi o seu primeiro contacto com ele? E como era a vossa relação?

Blimunda: A primeira vez que vi Baltasar foi no dia em que a minha mãe estava a ser condenada no auto-de-fé, e Baltasar estava a assistir. A minha mãe procurou-me no meio da multidão para me dizer que devia conhecer o homem que estava ao meu lado, e quem estava ao meu lado era Baltasar, ele até me questionou porque lhe tinha perguntado o nome e eu disse "Porque minha mãe o quis saber e queria que eu o soubesse" (Cap VI). Nunca nos chegamos a casar, mas fomos abençoados pelo Padre Bartolomeu, porque quando o Padre me perguntou "aceitas para a tua boca a colher de que se serviu a boca deste homem" (Cap VI) eu aceitei, foi o meu primeiro amor e no primeiro dia que o conheci já estava apaixonada por ele, tínhamos uma relação de puro amor, estava genuinamente feliz de viver ao lado dele e desde que nos conhecemos que temos uma ligação muito especial, entreguei-me bastante, perdi virgindade, para a nossa união desenhei com o meu própio sangue uma cruz no peito dele ("Blimunda persignou-se e fez uma cruz no peito de Baltasar"; Cap V) e mais tarde saí de minha casa para viver com ele ("decidiu Blimunda que deixaria a casa para estar onde estivesse Sete-Sóis."; Cap IX) e mesmo depois da morte dele o nosso amor mantém-se vivo.

Bruna: Lida muito com a morte na sua vida, visto que pessoas bastante importantes para si faleceram e ainda assassinou um frade, como suporta tudo isso?

Blimunda: Pois, não é fácil, tento ser forte para seguir em frente. Em relação ao frade ele ofereceu-me estadia enquanto andava desesperada à procura de Baltasar que tinha voado na passarola, durante a noite tentou-me violar e em minha defesa matei-o e ainda hoje mantenho o mesmo pensamento "malditos sejam os frades" (Cap XXIV).

Bruna: E afinal que projeto era esse da passarola?

Blimunda: A passarola era um sonho de voar do Padre, que pediu ajuda ao meu Baltasar para a sua construção e eu também fiz parte desse projeto, inclusive fui recolher a Lisboa 2000 vontades para conseguirmos finalizar a construção da passarola e para que tivesse a certeza que estava tudo bem com a sua construção eu ia inspecionar a máquina ("Blimunda levanta-se mais cedo, antes de comer o pão de todas as manhãs (...) e vai inspecionar a obra feita"; Cap IX).

Bruna: Recolher 2000 vontades? Não percebi o que quis dizer.

Blimunda: Ah pois, peço desculpa, antes era um segredo que guardava para mim, pois a sociedade há alguns anos era diferente e visto que a minha mãe foi condenada por ter este dom e acharem que era fingimento mas já não tenho medo de expor, pois a sociedade mudou. Eu tenho um dom, que consigo ver as pessoas por dentro, para ser mais concreta, não só as pessoas, eu consigo ver por dentro de materiais e recolher as vontades das pessoas, foi por isso que disse que Baltasar nunca me ia deixar de amar, porque recolhi a sua vontade para o garantir ("Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda"; Cap XXV)

Bruna: Como reagiu Baltasar a esse seu segredo?

Blimunda: Sempre prometi não olhar Baltasar por dentro, e quando estou em jejum vejo o interior das pessoas, daí todas as manhãs antes de abrir os olhos, eu comia pão para que não o olhasse por dentro, e ele sempre se questionou o porquê de eu fazer isso. Certo dia ele escondeu-me o pão para poder descobrir, e quando disse "Eu posso olhar por dentro das pessoas" (Cap VIII) ele ficou incrédulo, e nem sequer acreditou, então no dia seguinte tive de lhe provar que isso era verdade, mas aceitou bem.

Bruna: Baltasar era conhecido por Sete-Sóis, e a sua alcunha é Sete-Luas, porquê?

Blimunda: O Padre batizou-me com essa alcunha porque Baltasar era Sete-Sóis porque via às claras e eu sou Sete-Luas pois vejo às escuras. E era mais que uma alcunha, foi um batismo ("e bem batizada que estava, que o batismo foi de padre, não alcunha de qualquer um.";Cap XIX).

Bruna: Muito obrigada pela disponibilidade, serviu para que entendesse melhor a sua importância no romance.

Blimunda: Foi com todo o gosto.

26/02/2020

 

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