«Não é fácil pensarmos em Portugal como um país bem-humorado, praticante
da ironia inteligente, ágil profanador das regras do bom comportamento,
do bom senso e do bom gosto. Apesar de termos inventado as cantigas de
escárnio e maldizer, apesar de termos tido um Camilo e um Eça, e de
sermos exímios praticantes da má língua no espaço privado (...)»
«Somos um povo ancestralmente pobre e analfabeto, daí estarmos mais à
vontade com a violência do sarcasmo, do que com as subtilezas da ironia.
A ironia é uma prerrogativa dos ricos, da burguesia, dos que podem ter
distanciamento suficiente dos factos para poderem fixar sobre eles uma
linguagem rebuscada e complexa. O sarcasmo está mais próximo do corpo,
da luta pela sobrevivência. Está mais próximo da obscenidade
carnavalesca: a libertação da ansiedade, da tristeza, do medo e da morte
fazem-se com as palavras obscenas. Ferenczi, discípulo de Freud,
escreveu que os palavrões serviam para descarregar a violência recalcada
em nós. Uma violência que sai do corpo e se faz palavra para aliviar a
nossa tensão.»
«Ricardo Araújo Pereira pertence à linha de cómicos eruditos que
procura nas palavras e pelas palavras fixar o mundo de outra forma.
Defende que as palavras, na sua remota origem corporal, são aquilo que
faz com que o corpo ceda ao riso, à convulsão da gargalhada. As palavras
são o órgão visceral do humor.
RAP sabe também que a frase “uma imagem vale mais que mil palavras” é
mentira, pois cada palavra contém um universo de significados, de
possibilidades, de trocadilhos, de imagens em constante metamorfose.»
Mais difícil do que rir dos outros é rir de nós mesmos. (...) Aprender a ironia e a auto-ironia é, pois, uma urgência neste país.(...) Qual é o escritor ou poeta português que ainda nos faz rir? Ricardo
Araújo Pereira lembra-se de Mário de Carvalho e dos poetas Jorge Sousa
Braga, Adília Lopes e Alberto Pimenta.(...). RAP lembra que há autores que nos fazem rir de formas muito diferentes: uns
porque são claramente cómicos, outros porque têm breves momentos de
sátira, e outros ainda que nos fazem rir apenas dentro da cabeça.
Joana Emídio Marques
LÊ AQUI O ARTIGO COMPLETO
LÊ AQUI a Entrevista com Ricardo Araújo Pereira sobre o seu livro «A Doença, o Sofrimento e a Morte Entram num Bar». « Porque o riso é também um prazer físico, ele foi durante milénios reprimido pela igreja e por todas as ditaduras.» J.E. Marques
"Sabrina Tacconi, terapeuta do riso, destaca a importância do riso na vida das pessoas
e os seus benefícios, que não são só emocionais e mentais, mas também
físicos. Melhora a oxigenação, o sistema cardiovascular e ajuda à
libertação de serotina, um antidepressivo natural, e de endorfinas,
responsáveis pelo bem-estar.", in Dia Internacional do Riso: "Devemos rir dez minutos continuados por dia", in DN, Jan 18, 2019